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A Reforma Tributária e o Novo Cenário para a Advocacia Penal Empresarial

Com a implementação gradual da reforma tributária, por meio da Emenda Constitucional 132/2023 e da Lei Complementar 214/2025, o Brasil entra em uma fase de transição que, embora represente avanços no âmbito tributário, acarreta impactos significativos na esfera penal, notadamente nos Crimes Contra a Ordem Tributária. A coexistência de tributos antigos e unificados por um período de oito anos, ditada pela regra de transição, suscita um questionamento fundamental para a advocacia: qual o novo cenário para os profissionais que atuam no Direito Penal Empresarial e na defesa contra crimes fiscais?

A sonegação de impostos, em sua essência, constitui um desafio persistente para o fisco e o Poder Judiciário no contexto do Direito Penal Econômico e Tributário brasileiro. As ramificações penais dessas condutas têm se tornado progressivamente mais intrincadas e rigorosas, impulsionadas pelo crescente investimento estatal em mecanismos de fiscalização e combate aos ilícitos tributários. Dessa forma, quaisquer ações que, por meio de fraude, omissão de informações ou manipulações contábeis, visem à redução de tributos, devem ser abordadas com firmeza penal, a fim de mitigar o impacto econômico dessas práticas no erário público.


A recente sistemática de arrecadação promoveu a unificação dos tributos sobre o consumo na CBS (federal) e no IBS (estadual e municipal). Buscando, com isso, simplificar o processo de recolhimento para os contribuintes. Por outro lado, busca também otimizar a eficiência da fiscalização por parte dos Fiscos. Contudo, apesar da aparente simplificação, emerge um ponto crucial a ser ponderado no que concerne aos crimes tributários. Em particular, diante de um possível concurso de crimes. Isso se deve ao fato de que a reforma transcende a mera substituição de impostos e contribuições, configurando uma alteração substancial no sistema de declarações e pagamentos das diversas pessoas jurídicas. Isso tem um potencial elevado para gerar controvérsias e equívos em sua aplicação.

Responsabilidade Criminal dos Gestores de empresas

Neste panorama, é imperativo fomentar debates, especialmente no que tange à responsabilidade criminal dos gestores de empresas. Os crimes tributários no ordenamento jurídico brasileiro frequentemente emanam de atos administrativos e contábeis, tais como a omissão de informação ou a apresentação de declara declaração falsa às autoridades fazendárias. Tais condutas podem, por vezes, decorrer de uma interpretação inadequada da norma, que, no entanto, seria suficiente para configurar a materialidade do delito.


Um foco de preocupação imediata reside nas empresas que usufruem de benefícios fiscais. De acordo com o artigo 2º, IV, da Lei 8.137/90, configura crime a conduta de “deixar de aplicar, ou aplicar em desacordo com o estatuído, incentivo fiscal ou parcelas de imposto liberadas por órgão ou entidade de desenvolvimento”. Essa tipificação legal suscita apreensão, considerando a complexidade das legislações federais, estaduais e municipais incumbidas da regulamentação da matéria. Em outros termos, ainda que a arrecadação e a cobrança sejam centralizadas pelo Comitê Gestor, cada ente federado preserva sua autonomia para definir alíquotas, fiscalizar e lançar o tributo. Em regra, essa configuração pode resultar em uma situação na qual um mesmo fato jurídico-tributário impacte patrimônios públicos de distintas titularidades. Consequentemente, a resposta penal afigura-se, naturalmente, excessivamente severa e desproporcional.


Embora possa soar redundante, é crucial reiterar que o Direito Penal se debruça sobre a questão da dosimetria da pena em situações de concurso de crimes. Conforme amplamente conhecido pelos operadores do direito na área, a matéria encontra seus preceitos nos artigos 69 a 71 do Código Penal. Neste aspecto, indaga-se: como a reforma se refletirá na avaliação e aplicação da insignificância de uma eventual conduta? E, em outro viés, como se dará o possível reconhecimento de uma causa de aumento da pena em virtude de grave dano coletivo?

Declaração Efetuada pelo Contribuinte

Ademais, partindo da premissa da unificação dos tributos, é razoável inferir que a declaração efetuada pelo contribuinte abrangerá, necessariamente, múltiplos fatos geradores. Diante disso, questiona-se se tal declaração deve ser interpretada como uma ação única sob a ótica penal. Alternativamente, caso a resposta ao questionamento anterior seja negativa, devemos considerar a declaração como uma conduta com múltiplos resultados? Tal interpretação configuraria, portanto, concurso material, ensejando a soma das penas por cada patrimônio afetado ou por cada tipo de tributo envolvido?


Em derradeiro, é possível vislumbrar que a advocacia penal no cenário pós-reforma tributária demandará uma preparação ainda mais robusta para enfrentar esses e outros dilemas que exercem influência significativa na atividade econômica de diversas pessoas jurídicas e, em maior grau, de seus gestores. Portanto, o Advogado que almeja atuar nesta seara não poderá circunscrever seu conhecimento tão somente ao Direito e ao Processo Penal. Nesse sentido, afigura-se que a abordagem mais eficaz, até o presente momento, reside na prevenção. Em outras palavras, isso implica em oferecer treinamentos personalizados, alinhados à atividade específica do cliente. Com especial atenção aos setores contábil/fiscal e de compliance, com o propósito de minimizar os riscos advindos da transição da legislação tributária.

A Reforma Tributária e o Novo Cenário para a Advocacia Penal Empresarial

Por Luiz de Araújo Luna Neto*

*Advogado Criminalista com atuação voltada para o Direito Penal Empresarial. Master of Law em Direito Tributário, Pós graduado em Direito Penal Econômico e em Processo penal. MBA em Compliance Anticorrupção. Secretário Geral da comissão de Direito Penal do IAP. Membro do grupo de Estudos avançados em Direito Penal econômico do IBCCRIM. Membro do Grupo de pesquisa “política e Tributação”, inscrito no CNPQ desde 2004 e Membro da Associação de Governança em Dados e Tecnologia. Professor de Processo penal.

Revista Paradigma Jurídico Ed. IV pág. 48 – Agosto 2025.

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